segunda-feira, 17 de setembro de 2012

Quarentão.

Estou chegando aos quarenta. Inacreditável.
Lembro que quando era bem pequeno, bem mais novo, ficava pensando como
seria meu futuro. E fazia isso me imaginando com idades avançadas. Era
divertido este tipo de meditação. Acho que deve ser por isso que não
me preocupo muito com o avançar da minha idade. Eu sempre tive
diversas curiosidades sobre minhas etapas futuras. Ficava me
imaginando com cabelos brancos, como seriam meus filhos, o que estaria
fazendo, etc. Hoje tenho respostas para muitas das questões. E
continuo a pensar da mesma forma, me questionando como serei amanhã e
depois. Só que agora, já quase um quarentão, a mesma curiosidade vem
aliada a planos e objetivos. Antes tinha toda uma estrutura montada
por meus pais. Hoje, sem eles, meus objetivos são mais pensados,
planejados. Até porque hoje eu sou o pai. Tenho minha filha, tenho
uma vida, profissões, gostos diferentes, manias adquiridas, loucuras e
chatices.
Um dia destes eu estava fazendo uma retrospectiva da minha existência.
Fiquei pensando em tudo o que já fiz, nos caminhos que já percorri. E
são muitas as histórias. Já passei por muita coisa que meus
contemporâneos nem sonham. E cheguei a uma conclusão meio louca sobre
miha vida. Imaginei tudo como um gráfico, que até hoje seguiu uma
tragetória tortuosa, só que ascendente. Todos estes anos, todas estas
mudanças... tudo em uma linha que veio subindo no gráfico. Agora,
chegando aos quarenta, imagino o pico deste gráfico. O ponto mais alto
da pirâmide. E pensei que chegando neste ponto, tudo deve dar uma
mudada radical. Pois agora esta linha chegara ao fim. Daqui para
frente é descendente. É o meio da minha existência. Se eu conseguir
viver mais quarenta, estará de ótimo tamanho. Se passar, já acho
exagero. Não quero tanto. Então, venho fazendo diversos planos para
que eu torne estes próximos quarenta, anos bem desfrutados. Sim, pois
até hoje não desfrutei de nada como deveria. Realizei muito, mas não
desfrutei como deveria. Aprendi bastante, mas não coloquei muito em
prática a maioria do que aprendi. Penso que daqui para frente é para
mais colheita do que para plantação. É lucrar mais, gastando menos.
Quero me estabelecer, ser mais estável. Coisa que nunca fui até hoje.
Sempre busquei muito, novos horizontes. Mas fiz isso, destruindo
muitos castelos que eu mesmo subi. Ou seja, já está tudo planejado. É
só seguir o plano.
Em relação a saúde, penso no meu passado (fui uma criança super
doentia. Tive diversas doenças e problemas. Desde artrite reumatóide a
sopro no coração). Mas sobrevivi. Não por mérito só meu. Tive pais
guerreiros que lutaram muito para eu chegar aqui nos meus quarenta.
Imagino que daqui para frente começarão a aparecer as doenças
decorrentes de todo este sofrimento do passado ( e do meu presente).
Meu corpo não é tão forte justamente porque durante sua formação tive
muitos problemas. Meu pulmão já foi muito massacrado pela bronquite
asmática. Meu coração pelo sopro, meus ossos pela artrite, meus olhos
pelas longas horas de trabalho (e duas aplicações de laser no
esquerdo). Meu cérebro pela pressão alta (AVC eminente). Meu fígado
pela bebida. Meu estômago pela louca alimentação... ou seja. Daqui
para frente é ficar atento e preparado para o pior. Só não quero dar
trabalho nem preocupação a ninguém. O resto, levo na manha. Estou
preparado.
Neste caminho louco que escolhi para viver. Sempre contra a maré,
contra a correnteza (se não for deste jeito, não sei ser eu). Sei que
terei pela frente provas dificílimas.
Como não tenho a menor intenção de me casar, estou preparado para a
solidão ( já me vejo até em algum asilo recebendo visitas de netos,
amigos, alunos, sobrinhos– risos). Pois, ninguém vai me aturar mais
velho. Ninguém! Serei um velho super chato e metido a esperto. Já sou
assim, só que novo. Serei um velho indomável, que tentará fugir para
a rua, para andar, beber e fazer algo super radical como pegar um
ônibus sem destino (sim, não pagarei passagem por ser idoso e
expulsarei qualquer um que estiver sentado na cadeira reservada à
mim). E com todas as dores do meu corpo surrado ainda vestirei meu
kimono e darei uns chutes altos ( na linha da cintura). E quando eu
cair e quebrar a bacia, ficarei de cama. Só que não deixarei ninguém
limpar a minha bunda. Eu darei um jeito. Pensando nisso, lembrei do
meu pai, nos seus últimos dias, quando ele passou três dias internado
no hospital de base e eu cheguei quando os enfermeiros estavam
tentando dar um banho nele. Ele se debatendo e gritando: "Tá pra
nascer o macho que vai baixar minhas calças" Eu senti um orgulho foda.
Olhei para ele e me senti forte. Pensei, eu vim deste cara que está
ali na merda, mas ainda de cabeça erguida e lutando pela sua honra.
Fiquei emocionado. Ele foi assim. Morreu livre e lutando contra tudo e
todos. Ele nunca se entregou. Eu serei pior que ele. Sei que sim.
Me vejo também como um avô que influencia mal os netos (e sobrinhos).
Vou ser aquele velho todo riscado, com tattoos borradas, tomando
sempre uma bebida e falando merda. Sei que as crianças adorarão. Mas
meus irmãos, não. Talvêz minha filha ache legal. Mas o marido dela,
com certeza, não. E eu serei uma uma presença não desejável nos
encontros de família. Isso, com certeza. Anti-social e ao extremo.
E minha morte? Ah, ela vai vir. Aliás, depois dos quarenta, ela já me
soprará nos ouvidos. Meus pais viveram menos que oitenta. E penso
nisso. Se for de família, cada dia é como se fosse a contagem
regressiva. Tranquilo. Que venha. Mas, vai ser divertido, eu lá
edurecido no meu caixão, algumas pessoas chorando, outras sérias, uns
falando bem, contando minhas histórias. E outros ali só para conprovar
se eu fui mesmo. Se sou eu de fato.
Fico pensando, no que farão com minhas coisas? Tenho algumas revistas,
muitos livros, muitíssimos filmes. Escritos. E por falar em escritos.
Um dos meus planos, para daqui para frente, é pintar e escrever mais.
Me dedicar a estas duas "manias" que tenho e que venho me dedicando
muito pouco. Vou criar metas de produção. Quem sabe, uma exposição por
semestre e um livro por ano. Será legal. Vou fazer isso. Então, será
que meus trabalhos terão algum valor depois da morte? Poxa, meu
espírito ficará feliz. Isso se espírito tiver ego. Sabe-se lá.
Bom, poderia escrever aqui páginas e páginas sobre as visões que tenho
da minha pessoa daqui para frente. Mas vou parar por aqui. Acho que já
escrevi demais sobre isso. O resto, guardo aqui na minha mente.
Chegarei aos quarenta em três dias. E este é o ponto mais alto do meu
gráfico. O pico.